domingo, 6 de julho de 2014

Davi e Golias em tempos modernos

Os Ex amores vivem em um plano distinto dos demais. Alguns dizem que eles vivem em um limbo, o que concordo, se bem que uma grande parte preferiria que eles vivessem em uma espécie de inferno astral.
Conhecemos, nos enamoramos, flertamos, trocamos confidências, carinhos, afetos, salivas, e as vezes, até escova de dentes. Fizemos planos, colocamos toda uma carga emocional, e então, por algum motivo, tosco para alguns, mas determinante para o casal, viraram ex. 
Astroaldo conhecera Rufia assim. Se olharam, se apaixonaram e se separaram. Ambos queriam, que se fosse possível, o outro mudasse de cidade, país, planeta, mas não foi assim. Permaneceram na mesma cidade. E era inevitável um encontro. E foi o que aconteceu. 
Astroaldo saiu para a noite. Em uma dessas, em um bar onde todo mundo cruza, mas todo mundo mesmo, até a sua ex, encontrara-a nos braços de seu atual namorado, Alto, grande, gordo, e Astroaldo, baixo, barrigudinho e desbocado. Trocaram olhares, se analisaram, olharam-se dos pés a cabeça. Astroaldo demorou mais para fazer essa análise, devido o tamanho do rapaz, achava-o mais feio que ele, mais desengonçado, se achou mais bonito, esbelto que o seu sucessor, um sorriso de vitória estampou-se no nos seus lábios. 
E em algum momento não descrito, e tão pouco compreendido, Astroaldo soltara alguma piada infame ao namorado da ex. Usando de toda a sua corpulência o atual veio em sua direção.  Astroaldo sentiu um arrepio na espinha e um arrependimento súbito veio-lhe a mente. Palavras ao ar, palavras ditas, não tem retrocesso, não tem volta. 
Ele pequeno e o namorado gigante seria uma tragédia anunciada. Astroaldo não tinha como escapar ao enfrentamento, já sentia em seu corpo os hematomas de um breve futuro que se anunciava, só pensava: "não bate no rosto, não bate no rosto!!!", seria inevitável pelo tamanho, pois era o primeiro lugar a ser alcançado. Precisava de uma outra estratégia. Tudo isso acontecendo em segundos. O rapaz veio em direção e colocou-se a milímetros de Astroaldo, era o fim. 
- O que você disse? Resmungara o namorado. 
Astroaldo não poderia voltar atrás, seria sua derrota moral, sua reputação estava em jogo. 
- O que você escutou... - respondeu Astroaldo mantendo a pose. 
- Repete se é homem! - Exclamava o namorado. 
Segundos de silêncio, Astroaldo engole em seco a saliva. 
- Até repetiria se soubesse exatamente o que disse. - ironizou.
- Baixinho covarde. Repete!
Então...
- Veja bem, chegamos a um impasse... - Tascou Astroaldo.
- Como? 
- É chegamos a um impasse. A uma situação quo, a um momento em que devemos nos digladiar ou discutir a respeito.
- Vou discutir com minha mão enfiada na tua cara! Gritou enfurecido o namorado levantando a mão.
Astroaldo já imaginou aquela mão lhe esbofeteando a cara e arrancando-lhe alguns dentes, e tascou:
- Pode ser, mas seria um equívoco. - sua frase tinha que ser curta e provocar alguma emoção contrária a reação do rapaz. E conseguiu.
- O que?
- Veja bem, você tem quase o dobro do minha altura, só a tua mão é do tamanho da minha cabeça. Em tempos onde não existem mais nem Davis nem Golias, eu certamente perderia para você com um só golpe. 
- Não conheço nem um Davis nem Golias. Tu me provocou, cara!
- Sim, talvez na emoção da circunstância, talvez elevado pelo álcool, quem vai saber? O fato é que se você desferir algum golpe em mim terá executado o lógico e óbvio. Não tenho escapatória. Mas o fato de nós partirmos para a briga física significa que todos os argumentos de racionalidade foram para o espaço. Sobrando apenas a selvageria. 
- É, mas tu não foi nada racional ao ofender a mim, e minha namorada. 
- Veja bem, nós poderíamos sentar em uma mesa de bar e discutir a situação e até te dizer que ela nunca vai gozar contigo como gozou comigo. 
Limbo temporal
Astroaldo fora levado para o hospital com fraturas nas costelas, sem 4 dentes, com um olho roxo e dois dedos da mão direita pelo avesso. 
Tem vezes que não há razão que resista a imbecilidade.   


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